Pela primeira vez, uma equipa de cientistas da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) estudou os danos que os nanoplásticos podem gerar nos ecossistemas de água doce. Apesar da maioria dos estudos sobre as consequências do plástico no ecossistema se debruçar nos sistemas marinhos, os rios são a principal fonte de plásticos dos oceanos.
O estudo, acabado de publicar na revista científica “Fungal Ecology”,
centrou-se no processo de decomposição das folhas, considerado um
indicador crucial para avaliar a função e a qualidade dos sistemas de
água doce. Para tal, a equipa utilizou cinco espécies de hifomicetes -
fungos aquáticos que assumem o papel principal na decomposição das
folhas.
Nas experiências realizadas em laboratório, com fungos isolados de
ribeiros suíços e folhas colhidas no Parque Verde de Coimbra, na
margem do rio Mondego, os investigadores verificaram que a
exposição a plásticos de tamanho nanométrico (100nm e até
~100mg/L) compromete a atividade dos fungos, ou seja, interfere na
sua capacidade de decompor as folhas.
«Demonstrámos que os nanoplásticos diminuem a capacidade dos
fungos para decompor as folhas a concentrações de 1,6 mg/L. Este
valor é cerca de quatro a seis vezes superior à concentração de
microplásticos reportada nos E.U.A e na Europa», relata Seena
Sahavedan, investigadora do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente
(MARE) da FCTUC e primeira autora do artigo científico publicado.
«As nossas descobertas documentam que os nanoplásticos podem
interferir com funções ecológicas nos ecossistemas aquáticos.
No
entanto, uma vez que diferentes fungos diferem na sua
sensibilidade, continua por desvendar o que aconteceria num
sistema natural de multiespécies», observa a investigadora.
Por isso, a equipa pretende desenvolver estudos mais alargados para
perceber quais as respostas das diferentes espécies de organismos:
«se as espécies tolerantes que permanecem forem funcionalmente
capazes de substituir as menos tolerantes, então a função
ecológica global (decomposição de resíduos) poderá manter-se
inalterável mesmo em locais com elevadas concentrações de
nanoplásticos», prevê Seena Sahavedan, acrescentando que o
trabalho agora publicado «aponta para a potencial importância de
uma alta diversidade de fungos nas correntes de água doce e
sugere que tais sistemas serão mais resilientes quando
confrontados com a poluição produzida pelos plásticos».
A poluição provocada pelos plásticos é conhecida como uma séria
ameaça aos ambientes aquáticos.
A produção de plásticos está estimada em 8.300 milhões de toneladas métricas e é previsível que, em
2050, cerca de 12.000 milhões de toneladas de plástico desperdiçado
esteja ou nos aterros sanitários ou no ambiente natural.
Calcula-se que todos os anos entrarão no oceano, pelos rios do mundo,
entre 1,15 e 2,41 milhões de toneladas métricas de plástico.
Os
plásticos podem ser fragmentados em partículas de tamanhos muito
pequenos (“nano”, ou seja, 1 centésimo de milímetro) cujos efeitos
ambientais ainda são desconhecidos, mas não deixam de ser uma
preocupação.
A investigadora Seena Sahavedan lembra que os plásticos de
dimensões nanométricas também são usados num vasto leque de
produtos tais como pasta de dentes, tintas de água e produtos
biomédicos. Mais particularmente, «o poliestireno, que é um tipo de
plástico muito versátil e que hoje em dia é usado nos mais variados
produtos (em embalagens de comida, recipientes de cosméticos,
pipetas médicas, etc.).
Uma vez que são produtos de utilização
única e que não são biodegradáveis, as moléculas de poliestireno
contribuem significativamente para os detritos encontrados nos
sistemas aquáticos.»
Este estudo foi financiado pelo projeto estratégico do MARE.
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